sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

O Consumidor Atleta...

Recentemente recebi um comentário da Pétala, que me pediu informações para fazer seu estudo sobre: A Responsabilidade Legal das Academias de Ginástica por conta de lesões causadas em exercícios mal feitos ou mal orientados. 
Um tema bastante interessante pois ao frequentar um estabelecimento que promove a saúde, esperamos sair saudáveis! Entretanto nem sempre temos o acompanhamento necessário e as lesões durante a prática esportiva aparecem. 


Uma das obrigações dos centros esportivos é tomar todos os cuidados para que não ocorram danos a saúde. Inclusive alertando, como tenho visto, nas academias de Curitiba, um aviso de que os anabolizantes podem causar sérios riscos a saúde.


Portanto é preciso analisar se a lesão é proveniente de uma má prescrição, ou se tratamos de uma simples e  irremediável consequencia da atividade física.


Uma das questões mais polêmicas seria definir até onde vai a responsabilidade das academias, e diferentes países e estados tratam o tema de várias maneiras. O principal ponto seria a exigência de um exame médico, e qual a profundidade deste exame? 


Em alguns locais, as leis proíbem a participação em academias e eventos esportivos sem um exame detalhado, e o principal contra-argumento é o da liberdade do cidadão em praticar atividades quando bem entender, pois imagina ter que provar sua saúde para participar de uma aula aeróbica, ou participar de um torneio de ping-pong!!


Algumas vezes as lesões são um risco necessário para o esporte, mas as precauções devem ser tomadas em medidas necessárias, a evitar riscos comuns e esperados...





Aprofundando um pouco mais, segue um trecho das minhas pesquisas monográficas...




3.2 A ATIVIDADE FÍSICA COMO RELAÇÃO DE CONSUMO
3.2.1 Consumidor Atleta
            James, citado por Hazel Hartley, define a negligência, como causa mais comum do dever de indenizar frente os danos sofridos no decurso de um esporte.[1] A doutrina Norte Americana, trata do tema como modalidade de culpa presumida, ou seja, quando não observado um dever de cuidado e dele resultando um dano, caracterizada será a negligência, é o princípio chamado de duty of care:
            “A claim for negligence might be defended if it can be shown that there was no duty of care owed in a relationship (…)”[2] [3]
            Encontramos semelhança com a inversão do ônus da prova encontrada em nossa legislação, derivada da responsabilidade objetiva, qual também pode ser gerada a partir da culpa presumida. Acerca do tema, discorre Maria Helena Diniz: “(...) no nosso ordenamento jurídico reconhece-se em determinadas hipóteses a responsabilidade objetiva, conservando, porém, o princípio da imputabilidade do fato lesivo, fundado na culpa.”[4]
            Percebemos na legislação brasileira uma grande preocupação com o consumidor. Embora anotado por Rodrigues, que em relação à competição desportiva não existe relação de consumo, mesmo quando cobrado o valor referente à inscrição, o mesmo autor lembra que algumas normas do Código de Defesa do Consumidor têm aplicação geral, inclusive alcançando matérias tratadas por leis especiais, naquilo que não forem reguladas. [5]
            Entre os artigos do CDC mais relevantes para o nosso tema estão:
Art. 14. “O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.”
Art. 17. “Para os efeitos desta Seção, equiparam-se aos consumidores todas as vítimas do evento.”

            Equiparando-se ao consumidor todas as vítimas do evento, inclusive nos moldes do parágrafo único do artigo 2º do CDC: “equipara-se ao consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis (...)”.
            Ficando demonstrada a responsabilidade civil do organizador de eventos, a estes não cabe qualquer estipulação contratual que impossibilite, exonere ou atenue a obrigação de indenizar[6], cláusulas estas, usualmente encontradas diante do contrato de inscrição para determinados eventos esportivos e portanto de eficácia nula, com base no art. 51, I do CDC, qual também, em seu inciso III, anula as disposições relativas a responsabilizações de terceiros.
            Portanto, diante de defeitos ou vícios, não é possível a entidade que organiza o esporte, a isenção de indenizar diante de um acidente esportivo.
            Já com referência aos donos das dependências físicas, como academias, clubes e afins, onde ocorrem às disputas, por explorar e fornecer economicamente um produto, formam diretamente uma relação de consumo, portanto mais clara a imputação da responsabilização, devendo estes, ter diligências adequadas à boa prática esportiva, além do dever de advertir ostensivamente sobre os riscos e a periculosidade do desporto, conforme os artigos 8 e 9 do Código de Defesa do Consumidor.
             Nestas vias, disserta Hélder Gonçalves Dias Rodrigues:
“(...) Na prática, para o sucesso da ação o ônus da prova se transforma em dever obrigacional sob pena de perder a razão na causa processual. Assim, advindo dano da exploração da prática desportiva, a prova não será de quem o alegar, a não ser quanto a existência e ao montante do mesmo. Se a pessoa (física ou jurídica, de direito público ou privado, com ou sem fins lucrativos) que desenvolve a atividade desportiva não produzir a sua prova conforme demonstrado, no sentido de que não contribuiu de qualquer forma para o resultado danoso, poderá ser obrigada a reparar o dano decorrente dessa exploração, mesmo sem ter concorrido culposamente para o mesmo.”[7]

            De tal sorte, além dos titulares de instalações, também concorrem pela teoria do risco, os organizadores de eventos, quando as instalações em mal estado e/ou a segurança precária são negligências graves. Nestes casos, através da responsabilidade objetiva, cabe ao titular da propriedade, provar que as instalações estavam em condições adequadas e que não faltaram informações e advertências quanto aos riscos oferecidos pelo esporte em questão.


[1] Hartley, Hazel. Sport, Physical Recreation and the Law. 1. ed. Estados Unidos da América: Routledge, 2009, p.39.
[2] Tradução por Mauro Cavanha: A afirmação de negligência deve ser defendida caso possível demonstrar que não houve a falta do dever de cuidado, devido na relação.
[3] Hartley, Hazel. Op. cit. p.39.
[4] Diniz, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, 22. ed. rev. e atu. São Paulo: Saraiva, 2008, 7 v. p.53.
[5] Rodrigues, Hélder Gonçalves Dias. A Responsabilidade Civil e Criminal nas Atividades Desportivas. Campinas,SP:Sesrvanda, 2004, p.245-253.
[6] Conforme o art. 25 caput do Código de Defesa do Consumidor.
[7] Rodrigues, Hélder Gonçalves Dias. A Responsabilidade Civil e Criminal nas Atividades Desportivas. Campinas,SP:Servanda, 2004, p.297.


Espero ter aclarificado os direitos do consumidor atleta!!
Qualquer dúvida terei prazer em detalhar ainda mais os ensinamentos jurídicos!!

Um comentário:

Claudia disse...

Mauro, muito relevante a questõa que vc levantou. Vira e mexe somos lesados em nossos direitos, particularmente nas provas.
Parabéns pela iniciativa.